DAY 13
Lucano estava a caminho de Roma. Quanto mais se aproximava da cidade, mais a sensação excitante crescia. Naquela época, Roma já alcançara 700 anos, e era velha, agora, tendo cometido muitos pecados. Ficava-lhe bem ter sido fundada sobre um fraticídeo. Entretanto, seu declínio começara com o declínio da República, que passava a império absoluto. A estrada pavimentada de pedra, orgulho de Roma, estava apinhada de cavalos, bigas, carretas e carroças, carregadas de marcadorias e produtos. Um aqueduto corria paralelamente, suas águas altas cantando ao sol tépido da primavera. O que mais impressionava Lucano era a altura da cidade, os edifícios elevados, os apartamentos altaneiros, encostados uns aos outros e amparando-se uns aos outros, contrastando em suas cores: vermelho, amarelo-calcário, cinza-esverdeado... Roma absorvera todos os deuses das nações conquistadas por ela, num fervilhante panteão de religiões. Templos salientavam-se por toda parte, e através de suas portas de bronze corria um fluxo perpétuo de fiéis, os que levavam sacrifícios e os que saiam cheirando insenso... Mas, Lucano estava ali para missão das mais difíceis! Encontrar-se com César, que o havia chamado por saber que Lucano rejeitara o seu convite para ser médico-chefe oficial de Roma. (Extraído do Livro: Médico de homens e almas)
DAY 12
Após alguns dias dentro do navio, uma grande peste assolou a parte em que se encontravam os escravos. Sem hesitar, o comandante mandou que todos os escravos fossem trancados no porão da embarcação. A situação naquele local tornou-se insuportável: homens gemendo, vomitando sangue, as fezes se acumulavam, ratos, baratas e os corpos dos mortos jogados no chão. Por mais que o comandante do navio tentasse esconder aquela situação dos outros passageiros, ainda assim, Lucano percebeu e foi falar com ele dizendo: - Sou médico e posso ajudar. Mas, o camandante repondeu, eu tenho um médico do návio, mas você acha que vou arriscá-lo com esses escravos! Também, não posso entregar-te morto quando chegarmos... Entretanto, Lucano conseguiu um jeito de entrar no porão junto com seu amigo Cusa. Ao chegar com desinfetantes e remédios ao local... ordenou que matassem todos os ratos e baratas, que separassem os mortos em uma pilha para serem jogados no mar sem que o comandante visse, ministrou morfina para aliviar as dores daqueles que não restava mais nada a fazer e aos outros que lavassem seu corpos com a mistura de desinfetante que trouxera... O porão foi limpo e aquela peste que aos olhos do comandante dizimaria todos os escravos, ao contrário, foi controlada e o nome de Lucano corria entre as pessoas...
DAY 11
No seu desejo de trabalhar com os mais necessitados, Lucano embarcou em um navio para a Itália. No navio, ao contemplar a cidade de Alexandria, por uma razão qualquer foi subitamente assaltado por uma saudade e uma sensação de tristeza poderosas. Seu coração doeu comm um desejo sem nome, e ele sentiu-se solitário e perdido. Lutou contra suas emoções, às quais não podia atribuir face nem voz.
Porém, antes do navio partir, Sara veio despedir-se dele. Estava vestida inteiramente de preto e tinha roupas rasgadas aqui e ali conforme o costume judaico de usar luto (seu pai havia morrido). Seu cabelo preto mostrava sinais das cinzas que os judeus cobrem a cabeça para demonstrar o desgosto. Mesmo assim, era linda. Lucano, disse para Sara: - Onde eu vou, ninguém pode ir, nem irmão, nem irmã, nem mãe... nem esposa. Há muita coisa que eu preciso fazer, e não terei lar nem paradeiro. Não há lugar na minha vida para o amor pessoal, pois o amor, para mim, significa nada.
Mas, Sara respondeu: - Eu sempre poderei encontrar-te. O navio se deteve em vários portos, mas Lucano não subiu para vê-los. Era como se a vida se tivesse tornado para ele uma coisa que magoava terrivelmente, como se todas as suas feridas tivessem começado a reabrir com novas infecções. Suas lutas consigo mesmo tinham alcançado um estado insuportável. "Não posso amar de novo!", gritava ele, para si próprio.
(Extraído do Livro: Médico de homens e almas)
DAY 10
O tempo dos estudos na escola de Alexandria passou muito rápido. Agora, ele já era um jovem médico. Na verdade, um principiante, mas destacava-se até mesmo entre os mais famosos e experientes.
Lucano, exausto, deixou a enfermaria e o necrotério. Quando encontrou um amigo que disse: - Desejo um favor teu! Tenho um colega que está próximo da morte. Chama-se Eleazar e é um negociante rico, riquíssimo, e um bom homem. Irás vê-lo? Lucano respondeu: - Lamento, mas não desejo tratar de nenhum homem rico em parte alguma. Tomei a resolução de tratar dos miseráveis, pois estes não têm hospital em parte alguma. Por que não procuras os médicos competentes de Alexandria que estão ávidos de gordas remunerações?
- Olha, Lucano, não me consta que os ricos sofram menos com suas doenças do que os pobres, nem que Deus tenha outorgado a eles qualquer imunidade. Um câncer é tão doloroso em César quanto no mais mesquinho dos escravos! E é possível que ele tenha uma doença na qual estejas interessado em estudar... Então, Lucano partiu para a casa daquele homem doente chamado Eleazar. Ao chegar com seu amigo, a mais bela das jovens que Lucano jamais vira apressou-se a vir em sua direção com as mãos estendidas em afetuosa saudação - era a filha de Eleazar.
DAY 9
Após a morte de Rúbria, Lucano estava completamente obcecado pela ideia de ser um médico. Seus pensamentos fervilhavam: - Para que nasce um homem? Nasce só para torcer-se em tormento, e depois morrer tão ignominiosamente como viveu, e da mesma maneira sombria. Seus dias são curtos, e nunca livres de transtornos e dores. Sua boca se extingue no pó e ele desce a seu túmulo, e o horrível enigma.
Lucano, agora pensava em sua rebeldia juvenil: - Aprenderei a derrotar esse Deus! Arrancarei Dele as suas vítimas. Afastarei a sua dor dos desamparados. Ele estende sua mão para uma criança, e eu golpearei aquela mão, para afastá-la. Quando ele decretar a morte, eu decretarei vida. Essa será minha vingança sobre Ele pela morte de Rúbria.
Pouco tempo depois, Lucano já estava com Keptah conhecendo a realidade de um hospital... Ao passarem por uma pasciente chamada Júlia... Esta perguntou aterrorizada: - Vou morrer Senhor? Keptah respondeu que não e, logo, torceu um pedaço de linho, formando com ele um delgado cone branco., estancando a homorragia...
Diodoro, o pai de Rúbria, bancava os estudos de Lucano na Escola de Medicina de Alexandria e os anos de estudo passaram muito rápido. Todavia, Lucano continuava sem vida e com o semblante rígido como o mármore.
DAY8
Vem comigo - disse Keptah. Tomando Lucano pela mão, conduziu-o para a doce brisa da manhã primaveril e disse, serena e gravemente: - Tenho más notícias para ti, meu Lucano. A doença branca voltou em Rúbria, e ela morrerá antes que as folhas tombem.
Lucano enrijeceu. Suas faces tornaram-se como que de mármore. Durante os últimos dois ou três anos ele chegara a acreditar que Rúbria viveria.
- Não acredito nisso! - disse Lucano, com voz estrangulada, tentando arrancar o braço do aperto das mãos de Keptah. Agora, seus olhos brilhavam de dor e medo, e o rapaz olhava para Keptah como para um temível inimigo. Observando-o, Keptah viu o ódio violento e a agonia nos olhos do jovem, a amarga rebelião, a recusa. Disse alarmado: - Esqueceste, então, tudo quanto sabias, meu Lucano? Perdeste teu devotamento a Deus, e teu conhecimento Dele?
Lucano disse, através dos lábios ressecados: - Esqueci, Sonhei, como uma criança. Agora estou no mundo dos homens. - Então, como homem deves aceitar. A revolta é para as crianças, que não têm conhecimento. - disse Keptah, tornando a suspirar. - Pensas ser o único a conhecer o infortúnio? - perguntou Keptah. O coração revolta-se contra a dor, pois isso é natural. Mas tu conheceste mais do que a dor. Conheceste Deus.
DAY 6
Keptah, o médico professor de Lucano, e este jamais falavam da morte inevitável de Rúbria. Na verdade o rosto bonito de Rúbria estava mais cheio e alerta com a alegria de ser jovem e querida, e seu apetite melhorara, podendo ela, em curtos intervalos, poder brincar vigorosamente com Lucano. Mas sua doença mortal, Keptah o sabia, permanecia latente. Para Lucano era bastante estar junto de Rúbria, tocar-lhe a pequena mão quente, trocar com ela olhares divertidos, correr pela grama e apanhar uma flor imensa, vermelha e úmida para colocar atrás da orelha da menina. Havia momentos em que ficavam tão dominados por uma alegria inenarrável, que apenas podiam olhar nos olhos um do outro, com radiante gozo e timidez. Dia a dia Rúbria fazia-se mais bela. Às vezes, ele pensava: Com certeza Deus não levará de mim este tesouro, esta querida, esta irmã, este coração do meu coração. Sem Rúbria não haverá canções, nem alegria no sangue, nem ternura, nem razão para existir. Às vezes, sem se falarem, beijavam-se, e a sensação da face de Rúbria encostada à face de Lucano dominava o menino em fervorosa beatitude. Keptah já não advertia Lucano quanto à inevitável desolação. Ele próprio acreditava na presença de algo sagrado e iluminado pela inocência...
DAY5